Resiliência (Do lat. resilientìa, part. pres. neut. pl. de resilíre, «saltar para trás; recusar vivamente»)
Em ecologia, resiliência, é a capacidade de um determinado ecossistema de retomar sua forma original após uma perturbação. Pode também ser definida como limite resistência do ecossistema a uma mudança para que esta não se converta numa situação irreversível.
Quando se evoca a necessidade de conservar a biodiversidade pensa-se em geral nas espécies ameaçadas de extinção e nas consequentes perdas de informação genética. Mas esse, além de não ser o único prejuizo econômico imposto pela redução da biodiversidade, pode nem sequer ser o principal. Bem pior pode ser um tipo de enfraquecimento dos ecossistemas que os torna mais vulneráveis aos choques. Isto é, uma diminuição de sua capacidade de enfrentar calamidades naturais ou súbitas destruições provocadas pela sociedade sem que desapareça seu potencial de auto-organização. É o que em linguagem científica chama-se de resiliência: a capacidade de superar o distúrbio imposto por um fenômeno externo.
As implicações desses dois aspectos da biodiversidade são bem diferentes. Se o principal problema da redução da biodiversidade for a perda de informação genética, suas consequências serão mais globais do que locais. Contudo, se a queda da resiliência revelar-se mais importante, as consequências estarão mais diretamente relacionadas à debilidade de um determinado ecossistema, sendo, portanto, mais locais do que globais.
A necessidade dessa mudança de ênfase - da perda de informação genética para a perda de resiliência - é o principal alerta de uma grande pesquisa promovida pelo “Beijer International Institute of Ecological Economics”, um instituto dedicado ao estudo da interdependência dos sistemas econômicos e ecológicos, criado em 1991 pela Academia Real de Ciências da Suécia. Sob a presidência de Partha Dasgupta, professor de economia da Universidade de Cambridge, esse instituto tem como principal objetivo a promoção de pesquisas interdisciplinares entre cientistas naturais e sociais, principalmente entre ecólogos e economistas. E os primeiros resultados dessa iniciativa estão no livro Biodiversity Loss: Economic and Ecological Issues, editado por Charles Perrings, professor de economia ambiental da Universidade de York (Cambridge University Press, 1997).
Todos os trabalhos incluídos nesse livro enfatizam a idéia de que a dinâmica dos sistemas econômicos não é independente da dinâmica dos sistemas ecológicos nos quais os primeiros estão embutidos. Argumentam que o crescimento econômico engendra uma dinâmica conjunta cada vez mais descontínua dos dois sistemas, que não pode ser captada pelas atuais teorias econômicas e biológicas. Daí a importância que atribuem às fronteiras do conhecimento que começam a ser exploradas pelas teorias da complexidade, basicamente a teoria do caos e a das estruturas dissipativas.
Mas isso não quer dizer que os resultados dessa primeira pesquisa interdisciplinar do Instituto Beijer situem-se apenas nesse alto nível de abstração, carecendo de aplicações práticas. Ao contrário, vários trabalhos mostram o quanto podem ser prejudiciais os modelos de gestão de recursos naturais baseados na velha visão de equilíbrio contida tanto na economia (desde a revolução marginalista dos anos 1870), quanto na ecologia (desde F.E. Clements 1916). Uma das contribuições mais surprendentes é a que mostra a racionalidade de certos sistemas tradicionais de pastoreio em zonas semi-áridas que costumam ser condenados pelos economistas. Focalizando principalmente o caso da África Sub-Sahariana, mas considerando também amplas áreas do Sul da Ásia e da América Latina, o trabalho conjunto do economista britânico Charles Perrings com o ecólogo australiano Brian W.Walker mostra que esses sistemas tradicionais são mais eficientes e têm muito menor impacto ambiental negativo do que afirmam os estudos baseados nas teorias econômica e ecológica dominantes. Principalmente porque seu manejo da diversidade das espécies vegetais não reduz a resiliência dos pastos naturais.
Outra contribuição importante do livro Biodiversity Loss é reforçar a idéia de que os diversos métodos de valoração econômica que procuram atribuir preços a elementos do meio ambiente são inconsistentes do ponto de vista científico, por mais cômodos e oportunos que possam ser. Se já era difícil engolir a idéia de que a extinção do mico leão dourado pode ter um preço monetário razoavelmente calculado, o que dizer, por exemplo, da redução da resiliência dos fragmentos florestais onde ele ainda não foi extinto? Seria seu preço comparável ao da redução da resiliência da caatinga nordestina?
Basta enunciar essas perguntas para perceber como podem ser ilusórias as tentativas de recauchutagem da teoria econômica dominante (neoclássica) para responder aos novos problemas colocados pelo avanço da consciência ambiental. Quando se faz um esforço sério para integrar economistas e ecólogos em pesquisas científicas - como foi a referida iniciativa da Academia Real de Ciências da Suécia - os resultados vão numa direção completamente diferente.
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